As Guianas: a colonização que ainda vive na América do Sul
Enquanto a maior parte da América do Sul fala português ou espanhol e se vê como parte da América Latina, existe uma região onde essa regra simplesmente não se aplica. As Guianas — Inglesa, Francesa e Holandesa (Suriname) — são um pedaço do continente onde a colonização europeia não ficou no passado. Elas falam francês, inglês e holandês, usam euro e mantêm até hoje vínculos diretos com potências europeias. Neste artigo, você vai entender por que essa parte do continente se manteve isolada e ainda é considerada uma colônia moderna.

A história esquecida das Guianas
Durante o período das grandes navegações, o Tratado de Tordesilhas (1494) dividiu o continente entre Espanha e Portugal, ignorando completamente o que viria a ser a região das Guianas. Considerada de pouco interesse pelos espanhóis, por seu território úmido, denso e sem grandes riquezas aparentes, acabou sendo ocupada por França, Inglaterra e Países Baixos, que não estavam incluídos no tratado original.
As Guianas surgiram como entrepostos comerciais, mas logo se tornaram plataformas de exploração colonial, com trabalho escravo, plantações de açúcar e depois com mão de obra contratada da Índia, China e Indonésia, criando um mosaico cultural sem paralelo na América Latina.
Uma geografia que isola e molda
A geografia das Guianas também ajudou a mantê-las afastadas do restante da América do Sul. A região está assentada sobre o antigo Escudo das Guianas, com montanhas, florestas densas e solos instáveis, o que dificulta comunicação terrestre e impede integração com países vizinhos, como o Brasil ou a Venezuela.
Enquanto grande parte da América do Sul se conectava por rotas internas e planícies navegáveis, as Guianas sempre estiveram voltadas para o Atlântico Norte, ligadas culturalmente ao Caribe e à Europa.
Colonização que persiste
Mesmo após os processos de independência — Guiana em 1966 e Suriname em 1975 — a Guiana Francesa ainda permanece como um departamento ultramarino da França. Quem nasce lá é cidadão europeu, vota para o presidente francês e vive sob leis europeias, mesmo em plena fronteira com o Brasil.
A presença de militares franceses na fronteira com o Oiapoque é um lembrete visível da continuidade do domínio europeu.
Diversidade étnica e identidade caribenha
Com uma população formada por africanos, asiáticos, indígenas e europeus, as Guianas formam uma das regiões mais etnicamente diversas do planeta. No Suriname, por exemplo, a maioria da população é de origem indiana.
Esses países são membros da Caricom, a comunidade do Caribe, e se identificam muito mais com o Caribe do que com a América do Sul. A Guiana fala inglês, o Suriname, holandês e a Guiana Francesa, francês, em contraste com os 420 milhões de sul-americanos que falam português ou espanhol.
Interesses estratégicos e econômicos
Além do fator histórico, há também interesses econômicos atuais. A Guiana Inglesa, por exemplo, possui uma das maiores reservas de petróleo offshore do mundo, estimadas em mais de 2 trilhões de barris. Esse potencial energético reforça o interesse europeu em manter influência direta sobre a região.
A zona econômica exclusiva da Guiana Francesa também pode esconder grandes reservas petrolíferas, o que impede a França de abrir mão do território.
Conclusão
As Guianas são, ao mesmo tempo, um retrato do passado colonial e uma demonstração de como geopolítica, economia e geografia podem moldar a identidade de uma região por séculos. Mesmo encravadas na América do Sul, essas nações vivem com o olhar voltado para a Europa e o Caribe, isoladas linguística, cultural e fisicamente do restante do continente.